Os artigos que escrevi sobre a recente viagem que fizemos pela Sicília e Malta, despertou a curiosidade de alguns leitores sobre este roteiro.
Preparado com profundo conhecimento dos Roteiros de Enogastronomia pelo mundo, foi fruto do trabalho da Zenithe Travelclub de Mariella Miranda e German Alarcon Martin, com quem viajo desde 2004 levando grupos pelo mundo da enologia. Desta vez fomos 33 passageiros nesta jornada Enogastronômica e Cultural, visitando cidades, mercados, museus, vinícolas e restaurantes premiados pela Sicília e Malta, com uma extensão pela Costa Amalfitana.
Uma bela oportunidade de conhecer uma região que foi palco de diversas culturas, já que povos muito diferentes ocuparam a Sicília: fenícios, gregos, cartagineses, vândalos, árabes, normandos e espanhóis; cada um deles dando uma contribuição inestimável a culinária, a enologia, e ao modo de viver do povo siciliano.
Os monumentos históricos quase intactos são um passeio à parte, como Vale dos Templos de Agrigento, um imenso sítio arqueológico com vestígios de muitos templos, entre eles o do Zeus Olímpico ou o da Concórdia (o melhor preservado de todos eles). E ainda conhecer castelos da época das Cruzadas, as capelas de Palermo, além de visitar o Etna.
Do alto da arquibancada com mais de 2 mil anos, o Teatro Antico de Taormina tem uma das vistas mais estonteantes de toda Itália, podendo ver a beleza do Mar Mediterrâneo bem aos pés do Etna, o mais alto (3352 metros acima do nível do mar) e ativo vulcão da Europa, que emoldura a paisagem de forma perfeita. Visitamos Siracusa, uma das grandes urbes da Magna Grécia, por onde caminhavam Platão e Arquimedes (que aliás, nasceu em Siracusa).
Malta está rapidamente se tornando uma das regiões vinícolas emergentes mais promissoras da Europa. Enquanto a tradição do vinho da ilha remonta a mais de 2.000 anos, as últimas décadas viram um verdadeiro “boom” em termos de qualidade, graças ao clima mediterrânico, solos ricos e o trabalho das vinícolas locais.
Os vinhos de estilo moderno de Malta não são apenas agradáveis de beber, mas também carregam uma enorme curiosidade. Para o pequeno tamanho da ilha, há uma enorme seleção de vinhos brancos, tintos e rosés; e porque as variedades de uvas autóctones de Malta guardam sua individualidade. Tanto a Girgentina (para produção de vinho branco) quanto a Ġellewża (uma variedade de casca tinta para tintos e rosés) são cultivares de uvas costeiras resistentes à filoxera. As videiras têm idade indeterminada, provavelmente com cerca de 50 anos, e ainda são frequentemente cultivadas a seco no método tradicional de vaso.
Esta viagem foi portanto uma ótima oportunidade de conhecermos o vasto patrimônio histórico, artístico e monumental, um grande legado da Humanidade, que nos oferecem estas antigas civilizações do Mediterrâneo. Uma experiência que adicionou novos sabores e saberes para cada um dos participantes do roteiro, além da degustação de 84 rótulos de vinhos provados ao longo de 8 visitas a vinícolas e 14 refeições oficiais do Roteiro. Durantes as tardes e noites livres de uma programação oficial, o grupo teve oportunidade de provar outros rótulos e outros sabores da culinária local. Os vinhos bebidos na Costa Amalfitana estão fora desta conta!
Se na Sicília tivemos a chance de conhecer o Etna e seus vinhos, na Costa Amalfitana visitamos Pompéia aos pés do Vesúvio e provamos vários rótulos.
● VINHOS VULCÂNICOS - Nos últimos anos, "Vulcânico" se tornou uma palavra da moda no mundo do vinho, com garrafas da Sicília, Santorini e outras ilhas vulcânicas disparando em procura por rótulos e popularidade.
Um número muito pequeno de regiões vinícolas está localizado próximo a vulcões ativos, adormecidos ou extintos, onde cinzas e lava de erupções passadas criaram um solo vulcânico único. Compreendendo apenas 1% da superfície mundial, é surpreendente que o solo vulcânico tenha uma importância tão grande contribuinte para vinhedos em todo o mundo. Quando as videiras são plantadas nestes locais, os vinhos resultantes podem ser incrivelmente distintos, com acidez pronunciada e características minerais salgadas. Os enólogos se reúnem em torno dos solos vulcânicos por conta da produção de uvas de qualidade superior, resultando em vinhos diferenciados.
Os solos vulcânicos são tipicamente inférteis, ao contrário de outros tipos de solo, pois não retêm a água. Embora isso possa impedir o agricultor comum de plantar vinhedos, os antigos viticultores e os enólogos acreditavam que há um tipo diferente de beleza no cultivo de uvas de vinho em solo vulcânico. As condições adversas das videiras que buscam a água e os nutrientes através do solo rochoso tornam as uvas menores, com as peles mais grossas, dando a estrutura ao vinho e o sabor mais rico.
A rocha e o solo vulcânicos dão ao vinho um caráter distinto. Enquanto a umidade pode ser limitadora, a densidade mineral no solo é alta, dando ao vinho uma estrutura e um perfil diferente de sabor. Esse aprimoramento da uva (e do vinho) atrai os produtores de vinho para plantar suas vinhas em solo vulcânico - mesmo quando pode ser mais complexo que o plantio em regiões de solo argiloso ou arenoso.
Embora uma vinha plantada em solo vulcânico possa ter menos rendimento por safra, isso não é de fato negativo. A combinação do pequeno teor de água da uva e das peles grossas dá ao vinho vulcânico seu famoso gosto que tantos desejem ao pedir uma taça de vinho tinto ou branco. Ano após ano, os vinhedos em regiões vulcânicas vão se desenvolvendo e suas uvas dão vida e o sabor aos vinhos produzidos.
Os vinhos vulcânicos mais conhecidos são da Sicília, a ilha na ponta da bota da Itália. Aqui, o vulcão Etna tem até uma denominação de origem controlada (DOC) onde os vinhedos crescem a 3.000 metros de altitude. As uvas autóctones Nerello Mascalese e Nerello Cappuccio fazem vinhos tintos leves a médios encorpados, e se destacam pela elegância com um toque mineral. Os enólogos da região do Etna também fazem brancos de variedades locais como Carricante e Catarratto e essa mineralidade se repete.
Em outros lugares da Itália, o Vesúvio, famoso por ter soterrado Pompéia sob 30 metros de cinzas, influenciou os vinhos da região da Campânia. Procure pelos tintos da Taurasi, feitos a partir da robusta e picante uva – a Aglianico. Além disso, a Falanghina, Fiano e Greco di Tufo que são uvas brancas importantes na região, geralmente mostram seu caráter mineralmente.
Quem é apreciador de vinhos sabe o quanto as condições climáticas, geográficas e topográficas possuem uma influência considerável na qualidade, sabor e aroma da bebida, certo? Afinal, são essas características, unidas aos processos de produção, que dão a cada vinho exclusividade e personalidade.
E quando se trata dos chamados vinhos vulcânicos, essa premissa não poderia ser mais verdadeira. Mas por que produtores e vinícolas escolheriam regiões próximas a vulcões para cultivar vinhas? Qual a influência e características desses locais que os tornam tão especiais e interessantes para a viticultura?
♦ O Solo Vulcânico - Os solos de origem vulcânica são muito escuros – quase negros – e são ricos em nutrientes como magnésio, cálcio, sódio, ferro e potássio, vindos não dos depósitos de lava em si, mas da ação da água que “passa” por esses depósitos, irrigando a terra e carregando todos esses compostos para o solo e infiltrando-os.
Os solos vulcânicos são os que se formam diretamente a partir do intemperismo de rochas vulcânicas, também conhecidas como rochas "ígneas extrusivas". Solos e terroirs vulcânicos podem realmente ser altamente variáveis um do outro, dependendo de sua química e cenário climático, mas no geral, os terroirs vulcânicos tendem a ser relativamente jovens e a produzir solos ácidos e superficiais.
Além disso, a porosidade das rochas vulcânicas faz com que elas consigam estocar muita água, que é liberada gradual e constantemente para a terra sob a camada de lava, garantindo uma ótima irrigação natural até em épocas de seca. Assim, as raízes das plantas se mantêm sempre ativas e bem nutridas.
As vinhas, suas uvas (que normalmente apresentam bastante concentração) e, consequentemente os vinhos, acabam sendo influenciados. Assim sendo, vinhos vulcânicos são aqueles produzidos com uvas cultivadas em solos também chamados vulcânicos, encontrados nas cercanias de vulcões ativos, adormecidos ou extintos.
As características desse tipo de solo são únicas na natureza, e por mais que pareça um mero detalhe, quando se trata de agricultura, os componentes e minerais presentes no solo possuem uma influência extremamente significativa na qualidade das espécies vegetais nele cultivadas.
Os terroirs basálticos compõem uma parcela significativa dos terroirs vulcânicos globais, são vermelhos escuros a pretos, férteis e retentores, com phs ligeiramente ácidos. As regiões com terroirs basálticos incluem o Etna, Willamette Valley no Oregon (Estados Unidos), Ilhas Canárias e Vale Yarra da Austrália.
Os solos vulcânicos compõem terroirs intermediários e félsicos. Nascidos de erupções extremamente violentas, esses solos não são tão consistentes quanto os solos basálticos. Esses terroirs incluem termos como andesita, riolito, tuff e obsidiana, e são encontrados nos vales de Napa e Sonoma nos Estados Unidos, Alsácia, Tokaj e Santorini.
Enquanto solos vulcânicos em regiões globais como Tenerife (na Espanha) pode ter mais de três milhões de anos, a maioria dos solos vulcânicos na costa oeste dos Estados Unidos é realmente muito jovem em comparação com outros tipos de solo, sendo que os solos vulcânicos dos Estados Unidos são tipicamente ricos em ferro.
Na região de Languedoc, no sul da França, os solos vulcânicos bem drenados criam excelentes condições para o cultivo de videiras. Esses solos levam a rendimentos mais baixos e mais concentração e corpo nos vinhos produzidos.
A excelente drenagem dos solos vulcânicos torna as videiras cultivadas neles, menos suscetíveis à filoxera. Isso leva a uma concentração sem precedentes nas uvas. As uvas concentradas não são necessariamente maduras ou frutadas, mas há menos água em relação às outras moléculas em cada uva, o que significa que a acidez também se concentra e, em climas vulcânicos mais frios, como as ilhas dos Açores de Portugal, você obtém uma concentração incomparável de compostos ácidos e sabores minerais.
Os vinhos feitos a partir de uvas cultivadas em solos vulcânicos podem ter perfis de sabor variados e complexos. A quantidade de ferro e potássio em muitos solos vulcânicos pode emprestar uma "doçura salgada" aos vinhos resultantes, e o Pinot Noir de áreas com solo vulcânico de argila rico em ferro tende a ser bastante elegante (Nova Zelândia é um bom exemplo).
Alguns enólogos acreditam que os solos vulcânicos podem contribuir com uma tensão emocionante, com alguma ousadia e qualidade salgada para os vinhos que produzem. Muitas pessoas percebem essa sensação na boca como mineralidade, mas é o reflexo de um vinho da abundância de pedra, metal e nutrientes no solo. Os solos vulcânicos fornecem grandes atributos aromáticos e pureza dos frutos do que outros solos, além de não apresentar muita secura fenólica e levar a um acabamento geral flexível e de dar água na boca.
No entanto, as conexões entre o tipo de solo e os sabores de vinho ou aromas são complexos. Parece que os terroirs que expressam aromas distintos e esfumaçados estão no ou muito perto de um vulcão verdadeiramente ativo. É possível que haja algum remanescente de cinzas vulcânicas no ar ou dentro do solo que é incorporado ao vinho, mas não há nenhuma pesquisa específica sobre o assunto, portanto neste sentido temos suposições apenas.
Na próxima semana continuaremos escrevendo sobre os Vinhos Vulcânicos !!! Saúde!!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (Este artigo está baseado em material disponível na internet, e minhas considerações durante a prova dos vinhos e pesquisas).