Entre 19 e 28 de abril, o XIV Festival Internacional de Música Renascentista e Barroca Americana Missiones de Chiquitos retornou à Bolívia. Os concertos são realizados a cada dois anos e foram realizados na cidade de Santa Cruz e em San Xavier, Ascensión, Concepción, San Ignacio, Santa Ana, San Miguel, San Rafael, San José, Chochís, Roboré e Santiago. São 10 dias de Festival, 110 concertos girando por essas cidades! Com grupos estrangeiros, vindos patrocinados por universidades e embaixadas e grupos musicais bolivianos de altíssima qualidade.
O Festival de Música Barroca de Chiquitania comemorou em 2024 sua 14ª edição e compreende um patrimônio de obras barrocas de missões jesuíticas que vieram evangelizar regiões sob o domínio colonial espanhol.
Tenho amigos que além do vinho, gostam de música barroca e acompanharam Elisa Freixo num roteiro pela Bolívia, para participarem deste Festival. E ninguém melhor que Elisa Freixo para guiar este grupo, pois após longo período de formação em órgão e cravo, no Brasil e na Europa, a paulista desde 1988 foi convidada, pela Fundação Cultural e Educacional da Arquidiocese de Mariana, a cuidar do órgão de sua Sé e a desenvolver um trabalho de divulgação em torno deste precioso instrumento. Além de suas atividades como concertista, que a levam a viajar regularmente pelo Brasil e por outros países, exerce intensa atividade didática, e vem produzindo uma série de gravações, ao órgão, como solista e camerista.
Os amigos me perguntaram o que havia de vinhos na Bolívia e após uma pesquisa, consegui responder que a região produz vinhos, incluindo rótulos premiados. Em 2013, Montevidéu, no Uruguai, sediou um concurso de degustação de vinhos às cegas. Os degustadores provaram vinhos tannat, feitos com uma uva originária (mas não universalmente apreciada) da França, que hoje é um produto de exportação valioso do Uruguai. O vencedor foi uma surpresa: um vinho boliviano. Foi a primeira grande medalha de ouro da Bolívia e, ouvir Ramon Escobar, o boliviano-americano cofundador da Chufly Imports, conhecido pelos vinhos e destilados bolivianos, o resultado foi inacreditável.
O vinho boliviano inclui vinhos tintos, brancos, de sobremesa, fortificados e espumantes, mas o país não é uma região vinícola muito conhecida.
A história da produção de vinho na Bolívia começa no século XVI com a chegada do colonizador espanhol. Para abastecer as ordens religiosas que viajavam com os conquistadores de vinho para a missa, foram plantadas as primeiras vinhas. Monges franciscanos plantaram as primeiras videiras em Tarija.
O fato de a Bolívia estar totalmente localizada em latitudes tropicais era um grande problema para os produtores de vinho. Embora as videiras, uma planta mediterrânica, não prosperem em climas tropicais, os espanhóis conseguiram obter sucesso plantando-as em vales em grandes altitudes. Os colonos conseguiram localizar temperaturas melhores para a videira acima de 1.500 metros de altitude e plantaram variedades como a Criolla, incluindo videiras Negra Criolla (também conhecida como Mission, Pas e Criolla Chica) e Muscat de Alexandria.
Foi a partir de 1960 e 1970, quando a moderna tecnologia e experiência em produção de vinho chegaram ao país, que a viticultura e a produção de vinho avançaram significativamente. Há cerca de 7.500 hectares de vinhas na Bolívia sendo que a parcela de 3.000 hectares é constituída por Muscat de Alexandria. A maior parte dessa produção é transformada em vinho, que eventualmente é destilado para criar o “Singani”, o conhaque nacional da Bolívia fabricado a partir de Muscat de Alexandria. Esta bebida destilada com 40% de álcool é frequentemente consumida misturada com ginger ale ou sucos de frutas regionais e captura a força aromática da uva Muscat.
A partir de 1990, os vinicultores bolivianos têm experimentado o plantio de diferentes variedades de uvas, concentrando-se em castas tintas que poderiam ser bem adaptadas às áreas de alta altitude. Quando os vinhedos estão localizados entre 1.500 e 2.800 metros acima do nível do mar, as variedades de casca fina geralmente não toleram o aumento da radiação UV e desta forma o sucesso do plantio foi alcançado com variedades francesas e espanholas menos conhecidas e alguns cruzamentos modernos.
A altitude é um diferencial do vinho boliviano e razão dele se destacar. Em média, o vinhedo em Napa está a cerca de 300 metros acima do nível do mar; na Borgonha - França, o vinhedo estaria cerca de 60 ou 90 metros acima do nível do mar; e na Bolívia, o vinhedo em média começa a 1.500metros acima do nível do mar. Então, tem-se um clima totalmente diferente onde o sol brilha muito mais forte, a atmosfera é mais rarefeita e quando você leva tudo isso em conta, a uva realmente muda em relação às áreas que estamos mais acostumados a degustar.
Em resumo, as uvas que você acha que conhece têm um sabor diferente quando cultivadas na Bolívia. Tannat é a variedade mais conhecida da Bolívia. A versão de alta altitude é mais equilibrada do que as versões de baixa altitude, às vezes mais robustas e rústicas.
A Muscat de Alexandria, usada para produzir “Singani”, é bastante doce em outros lugares. Mas esses sabores se equilibram nas terras altas e na selva da Bolívia, criando vinhos mais suaves.
A Bolívia tem hoje cinco áreas de produção de vinho (tradicionalmente, em publicações anteriores fala-se de três áreas): Vale Central de Tarija; Vale de Los Cintis, em Chuquisaca; Vale Samaipata, em Santa Cruz; Luribay, em La Paz; e Vinto, em Cochabamba. Oitenta por cento dos vinhedos e 93% da produção de uva vinífera estão concentrados no Vale Central de Tarija.
♦ TRÊS PARTICULARIDADES TORNAM A PRODUÇÃO DE VINHO NA BOLÍVIA ESPECIAL. São elas:
1)- A colheita é totalmente manual.
2)- 100% dos vinhos são de alta altitude. Para serem considerados como tal, todas as uvas devem ser cultivadas a 1 mil metros ou mais acima do nível do mar. No caso da Bolívia, os vinhedos ficam a 1,6 mil metros e além. Na prática isso quer dizer que, quanto maior a altitude, mais intensa é a luz solar que chega aos vinhedos, o que influencia diretamente no sabor e no aroma das uvas.
3)- Apenas 1% da produção de vinho é exportada. Assim, se você tiver a sorte de encontrar um rótulo boliviano por aqui no Brasil, compre logo. Caso contrário, terá de viajar para experimentar in loco.
♦ GEOGRAFIA E CLIMA - A Bolívia é um dos países geograficamente mais desafiadores do mundo. Encontra-se totalmente localizado em latitudes de clima tropical, o que não é bom para a viticultura. Entretanto, o país está localizado em vales de grandes altitudes. Na verdade, a maior parte dos vinhedos do país estão situados entre 1.600 e 3.000 metros. Nas demais partes do mundo, o vinho é produzido ao nível do mar, ou entre 300 e 500 metros, ou entre 800 e 1000 metros. Os vinhedos bolivianos concentram-se principalmente na altitude de 1600 a 2000 metros ou mesmo nas regiões quentes nos Andes onde há colheitas em áreas de 3.000 metros.
A elevada altitude da Bolívia confere aos vinhos do país um sabor único. A vinha média começa a 1500 metros acima do nível do mar, onde o brilho do sol é intenso. E devido à atmosfera ser mais rarefeita as uvas mudam seus aromas e sabores além de aspectos organolépticos. Além disso, os vinhedos se beneficiam da falta de ventos e umidade à noite. As temperaturas diurnas podem oscilar acima de 35º C, o que aumenta a acidez, e as chuvas de verão diluem o vinho.
Ao todo, há 25 vinícolas, sendo seis delas, Campos de Solana, Kohlberg, Bodega Sausini, Marquez de la Viña e Aranjuez, responsáveis pela maior parte do que é produzido.
♦ VINÍCOLAS DE TARIJA SÃO AS MAIS ALTAS DO MUNDO E COLOCAM A BOLÍVIA NA ROTA DO VINHO - Muito se engana quem pensa que a Bolívia é destino apenas para aventureiros. Um dos destaques são as vinícolas de Tarija, região que produz a bebida a partir de 1.600 metros acima do nível do mar, contando com uma vasta rota turística.
Vizinha de Salta, na Argentina, a cidade tem alguns pontos a seu favor: boa incidência de luz solar, chuvas escassas e amplitude térmica. Assim, consegue produzir vinhos de altitude, com maturação e álcool em níveis mais baixos do que os argentinos. Esse nicho do mercado se expandiu em meados de 1970, com a industrialização.
O vale de Tarija é a principal região produtora de vinho da Bolívia. As altitudes variam de 1.600 a 2.150 metros. O vale é amplo e fértil, com um clima ligeiramente mediterrânico e ventos fortes que as vezes impedem a maturação dos frutos das vinhas. Uma brisa fresca oriental influencia a viticultura, contribuindo para o estilo fresco e elegante da região.
Porém, devido à altitude, as condições são geralmente amenas e semiáridas. A irrigação é feita em rios localizados em diferentes vales.
Cerca de 93% da produção boliviana é concentrada no Vale de Tarija, que resulta em 5,7 milhões de litros de vinho por ano. Ao todo, são 25 vinícolas, sendo seis delas responsáveis pela maior parte do que é produzido. Entre as principais está a Campos de Solana, fundada em 1925. As vinhas produzem Cabernet Sauvignon, Riesling, Malbec e Merlot.
Com 25 anos de história, a Bodega Sausini pertence à família de Mario Hinojosa. Inicialmente, as videiras vieram da França para produzir Cabernet Sauvignon em solo boliviano, mais precisamente em San Luis y Sunchuwayco. Depois veio o Moscatel de Alexandria, o Merlot e por fim o Singani, um dos marcos regionais, elaborado com uva branca 100% pura, sem ingredientes químicos e uma produção limitada de 7.000 garrafas por ano.
Já a vinícola Kohlberg, de 1963, produz 15 mil garrafas por ano das uvas Cabernet Sauvignon e Malbec em Cochabamba. No Vale de La Concepción está na ativa há 31 anos a bodega familiar La Concepción, a 27 km de Tarija. São pioneiros na produção de vinhos varietais na Bolívia, apostando em uvas Syrah, Chardonnay, Sauvignon Blanc, Ruby Cabernet e Rosé.
Em Cochabamba se destacam as vinhas Marquez de la Viña e Aranjuez, premiada pelo vinho Tannat. A propriedade também produz vinhos Merlot, Cabernet Franc, Moscatel de Alexandria, Sauvignon Blanc e Chardonnay. Os vales de Sinti e Santa Cruz também entram na Rota do Vinho boliviano.
As vinhas estão a aproximadamente 1000 km ao sul de La Paz. A região está bem conectada com o restante do país, por meio de ônibus que saem da capital Expreso La Paz, Expreso del Sur, Expreso Pilcomayo, Expreso San Roque, Expreso el Bermejeño.
Para ir voando, pegue um avião rumo ao Aeropuerto Oriel Lea Plaza, que opera voos nacionais com as linhas aéreas BOA, TAM Bolivia e Aerocon. Também está ligada com o Norte da Argentina. Salta está a 568 km de Tarija.
♦ DICA DE VINHOS:
● VINÍCOLA CAMPOS DE SOLANA, no Vale Central de Tarija, Bolívia - No caso específico da vinícola Campos de Solana, trata-se de uma bodega localizada no Vale Central de Tarija. Com vinhedos a 1.850 metros acima do nível do mar, é considerada uma das mais modernas da América do Sul, tanto nas instalações quanto na tecnologia aplicada na produção de vinhos.
Apesar de relativamente jovem, tendo sido inaugurada em 2000, a Campos de Solana vem conquistando reconhecimento internacional em importantes concursos mundo afora, chegando, inclusive, a figurar na lista dos 20 melhores vinhos latino-americanos.
Entre seus rótulos mais celebrados estão o Tannat Único 2015 e o Trivarietal Tinto Reserva 2011. Malbec, Merlot, Cabernet Sauvignon e Riesling também são produzidos por lá. Uma dica para quem pretende viajar a Bolívia, a vinícola abre para visitação. Mais informações: www.camposdesolana.com. Outras vinícolas de destaque no país são Bodegas Landsua, localizada no Vale Samaipata e Vinos Aranjuez, em Tarija.
♦ VALE DE SANTA CRUZ - Constitui 100ha de área de vinhedos, que abriga a Bodega Uvairenda, que foi fundada no início de 2000.
● VINOS 1750 - 1.750 vinhos são produzidos pela Uvairenda, uma vinícola boutique localizada no Vale Samaipata, na Bolívia. Samaipata é a fronteira da viticultura sul-americana na encosta oriental dos Andes. A adega dedica-se à produção de vinhos de alta qualidade em pequena escala e a proporcionar ao visitante uma porta de entrada ao maravilhoso mundo dos Valles Cruceños, oferecendo a possibilidade de se envolver na experiência do vinho, conhecendo a natureza da produção dos vinhos, resgatar a essência do terroir Samaipateño enquanto aprecia a beleza do vale e degusta seus vinhos. Samaipata é apenas a porta dos Valles Cruceños, um paraíso a apenas 2 horas a sudoeste de Santa Cruz de la Sierra.
Imagem do grupo de brasileiros na Vinoteca 1750 (foto: Suzana Noronha)
Produz Tannat, Syrah, Cabernet Sauvignon, um Rosé de Syrah e um vinho branco de Torrontés, com variedades selecionadas cultivadas em encostas suaves, pedregosas e arenosas entre 1.700 e 2.100 metros acima do nível do mar. Características de ótimo frescor e jovialidade que convida irresistivelmente a bebê-los.
Um dos vinhos 1750 mais apreciados foi um Tannat bem fresco, sem passagem por madeira, o que de certa forma surpreendeu a todos.
♦ VALE DE CINTIS - O vale possui 300ha de vinha. Está localizado a 2.400 metros acima do nível do mar. A área é considerada o lar espiritual da vinificação tradicional em pequena escala. Existem cerca de 30 vinhas com trepadeiras com cerca de 100-250 anos, intercaladas com árvores molle e chañar .
Então, que tal degustar um vinho de altitude boliviano ao som de um órgão tocando música barroca por Elisa Freixo?
Saúde!!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (Este artigo está baseado em material disponível na internet, e minhas considerações em relação as pesquisas).
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