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Foto do escritorMarcio Oliveira - Vinoticias

“HEMINGWAY E OS VINHOS EM SUAS OBRAS”

O vinho é a coisa mais civilizada do mundo. Ernest Hemingway

O vinho tem um lugar privilegiado na literatura, sendo citado deste a antiguidade por filósofos e escritores em suas obras. Ele é amplo em sua capacidade de motivar narrativas, e que nos permitem entender como era a vida de civilizações mais antigas em torno da mesa, seus costumes e alegrias. Nestas situações, em que muitas vezes há a necessidade de correlacionar sentimentos, momentos de grande alegria e festividade, ou mesmo oportunidade de profundas reflexões introspectivas, o vinho é capaz de traduzir em uma única palavra todo um conjunto de diferentes sensações.


Não é a toa que o vinho é citado tantas vezes em obras da literatura, inclusive na moderna. Em seu livro “Por Quem os Sinos Dobram”, o escritor Ernest Hemingway, mostra sua verdadeira veneração pelo vinho citando a palavra 104 vezes. Repete a dose com moderação em “Paris é uma Festa” citando o vinho 48 vezes.


Ernest Hemingway, prêmio Nobel de Literatura em 1954, iniciou sua paixão pelo vinho quando foi morar em Madrid, como correspondente da Guerra Civil Espanhola (1936-1939). Hemingway era um bêbado notório que escrevia como poucos captando o apelo do vinho nos seus personagens.

Há várias citações famosas de Hemingway sobre vinho. Uma citação importante é feita por ele em seu livro “O Sol Também se Levanta” do final dos anos 1920. Em uma cena, o narrador e protagonista Jacob Barnes aponta: “Entrei para jantar. Para a França, era uma grande refeição, mas após a Espanha a comida parecia distribuída com parcimônia. Pedi uma garrafa de vinho. Seria uma boa companhia. Um Château Margaux. Era agradável beber lentamente, saborear o vinho, beber sozinho. Uma garrafa de vinho é uma boa companhia”.


No mesmo livro, que conta a história de um grupo boêmio de amigos expatriados após a I Guerra Mundial, Hemingway também cita o Champagne Veuve Clicquot, mas, na verdade, os personagens acabam bebendo Mumm.


Hemingway conheceu a região de Veneto na Itália quando, aos 18 anos, foi motorista de ambulância voluntário da Cruz Vermelha no front italiano durante a Primeira Guerra Mundial. Ele sempre foi o tipo de homem que gostava de viver perigosamente - caçar e pescar, fumar, viajar, comer e beber com generosidade. Foi correspondente que viveu na Espanha durante a Guerra Civil e na Europa durante a Segunda Guerra Mundial: viveu o Dia D e a libertação de Paris em primeira mão - e esteve na linha da frente para “libertar” o Hotel Ritz na Place Vendome.


Em 25 de agosto de 1944, o famoso fotógrafo Robert Capa entrou em Paris junto com a primeira linha de tropas aliadas e encontrou o motorista de Hemingway, armado, patrulhando a entrada do Ritz e o escritor, impassível, sentado dentro do bar bebendo champanhe, celebrando a vitória à sua maneira. Como conta Capa: «A princípio pensei que fosse general. Ele tinha um relações públicas, um tenente como assessor, um cozinheiro, um motorista, um fotógrafo e uma ração especial de bebidas alcoólicas. »


Nesta Paris recém-libertada, Hemingway começou a desfrutar de sua estada no Ritz, para comer nos grandes restaurantes da cidade. Deixou de lado os cafés e bares ao redor da Place de la Contrescarpe, passando a se dar ao luxo de qualquer tipo de extravagância. E Hemingway tinha um apetite pelas coisas boas da vida: desde charutos feitos por Don Alejandro Robaina, do mesmo tipo fumado por Winston Churchill e pelo querido amigo de Hemingway, Fidel Castro, até grandes farras com ostras Marennes-Oléron achatadas e ligeiramente tingidas de verde harmonizadas com Champagne ou Chablis e o queijo Pont-l'Évêque cremoso e pungente feito no sul da Normandia, que ele adorava regar com o gelado Sancerre.


Ele homenageou as ostras no seu livro “Paris é uma Festa”, publicado postumamente em 1964: «Enquanto comia as ostras com o seu sabor forte a mar e o seu gosto ténue metálico que o vinho branco frio lavou, deixando apenas o sabor do mar e a textura suculenta, e à medida que bebia o líquido frio de cada casca e engolia com o sabor crocante do vinho, perdi a sensação de vazio e comecei a ser feliz e a fazer planos. »


Apesar da variedade de iguarias gastronômicas que Paris tinha a oferecer, Hemingway permaneceu um carnívoro ao longo da vida, sem remorso. Quando criança, ele começou a comer os esquilos que caçava e as trutas que pescava. Mais tarde na vida, como um grande caçador, ele comia o antílope e outros animais que matava durante os safáris africanos, tendo seus guias cozinhando para ele.


Em Pamplona, ​​Espanha, na véspera da Corrida de Touros para a celebração de San Firmino, (o mesmo cenário que ele usou em seu primeiro livro, “O Sol Também se Levanta” em 1926, que o levou à fama) - ele comeu fartas porções de porco assado com volumes generosos de vinho Rioja de profunda cor rubi.


Em “Paris é Uma Festa”, Ernest Hemingway cita – “Naquela minha temporada europeia, todo o mundo considerava o álcool tão normal e sadio como qualquer bom alimento, além de grande fonte de alegria e bem-estar. Beber vinho, por exemplo, não era forma de esnobismo ou sinal de sofisticação, nem uma espécie de culto. Era tão normal como comer e, para mim, tão necessário. Jamais me ocorrera fazer uma refeição sem tomar vinho, cidra ou cerveja. E eu gostava de todos os vinhos, exceto dos que eram doces ou encorpados, e não podia imaginar que o simples fato de Scott ter tomado comigo algumas garrafas daquele esplêndido Mácon branco, suave e seco pudesse produzir nele alterações químicas que o transformassem num imbecil”.


“O vinho é uma das coisas mais civilizadas do mundo e uma das coisas mais naturais do mundo que foi trazida à maior perfeição, e oferece uma gama maior de prazer e apreciação do que, possivelmente, qualquer outra coisa puramente sensorial” (Hemingway).


Esta é a chave para a persistência da popularidade do vinho por milênios. Sua apreciação nos níveis mais altos requer uma sensibilidade supremamente cultivada e refinada, embora seus encantos aprimorem qualquer reunião social e possam ser desfrutados por quase qualquer pessoa. No entanto, é fundamentalmente um produto da natureza, não porque começa como uma plantação, mas porque suas propriedades estéticas são tão moldadas pelo clima, tempo e solo que nunca perde sua relação com “a natureza”, com fatores além do controle humano.


Se aprendermos a fazer vinho em um laboratório de acordo com uma receita, ele perderá muito de seu encanto. Com a mudança climática já moldando os hábitos humanos, a existência humana cada vez mais parece uma luta entre a natureza selvagem e incontrolável e o sonho do domínio absoluto do ser humano sobre a Mãe Terra e a Natureza. Essa luta se materializa em uma taça de vinho.

Conforme a natureza “selvagem” desaparece sob o ataque da tecnologia, ela se torna visível novamente apenas por meio de práticas culturais que simbolizam a obstinação da natureza, algo que oferece resistência à intervenção humana sem estar fora de sua órbita. O vinho serve como esse tipo de símbolo, e sua dualidade, requinte sofisticado e imprevisibilidade selvagem, é em parte o que o torna fascinante e apaixonante.


O apetite de Hemingway por bebidas ia muito além do vinho. Ele regularmente gostava do sofisticado coquetel Montgomery Martini preparado por Giuseppe Cipriani, o dono do Harry's Bar em Veneza, onde Hemingway passava grande parte do seu tempo no inverno entre 1949 e 1950, escrevendo em uma mesa de canto da sala Concordia, e onde ele escreveu partes do livro “Na Outra Margem entre as Árvores”.


E foi também em Veneza que o autor degustou um risoto de peixe com ragu de lagosta que o chef do Gritti Palace Hotel lhe preparou. E, quando podia, comia os gigantescos Marlins - que pescava nas águas abertas entre Key West e Cuba - que cozinhava junto com Gregorio Fuentes, o capitão de seu barco, El Pilar. Claro que eram os mesmos peixes enormes que seu personagem Santiago, de “O Velho e o Mar”, procurava capturar com paciência e tenacidade.


Em Havana, quando o mar estava agitado demais para a pesca, Hemingway festejava na Bodeguita del Medio, saboreava daiquiris no Floridita, o bar no final da ensolarada rua Obispo. Ele bebia o famoso rum cubano em sua casa imerso na exuberante vegetação verde da Finca Vigia, a dez quilômetros da capital, cercado por milhares de livros de sua própria biblioteca pessoal, seus troféus de caça e sua visão muitas vezes embaçada pelo álcool. Mas mesmo em Cuba, o pensamento se voltaria para os anos que passou na Europa: «se você tem a sorte de ter vivido em Paris quando jovem, então onde quer que você vá para o resto da sua vida, ficará com você, a ideia que “Paris é uma Festa


A paixão de Hemingway pelo vinho teve desdobramentos até no nome de uma de suas netas. Seu filho mais velho Jack Hemingway batizou sua filha mais velha como Margot Louise Hemingway. Dizem que o nome Margot foi dado já que Chateau Margaux foi o vinho tomado na noite de sua concepção. Margot depois mudaria a grafia de seu nome para Margaux, em homenagem ao vinho. Sua sorte, entretanto, não foi das melhores, já que seguindo a macabra tradição de família, suicidou-se em 1996 aos 42 anos de idade.


Hemingway também disse “Eu bebo para tornar as outras pessoas mais interessantes”. O que mostra que ele além de bebidas, comidas e saborear a vida, também entendia profundamente sobre as pessoas!!!


Saúde!!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (baseado em artigos disponíveis na internet e minhas considerações)

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