Diz a lenda que os georgianos estavam tão ocupados, entre festas e brindes, que perderam a reunião com Deus, quando este distribuía terras pelos povos. Pois bem, quando os georgianos finalmente apareceram, pediram desculpa, e explicaram que o brinde de cada pessoa era em agradecimento e louvor a Deus. Este, por sua vez, ficou tão impressionado que concedeu aos georgianos a terra que reservara para si.
Os antigos romanos, o Império Bizantino, os persas e os árabes dominaram partes da Geórgia em épocas diferentes, até o século XII. Após esse período, foi formado o Reino Unido da Geórgia, que durou até 1220, quando os mongóis o invadiram. Mais tarde, os turcos otomanos e os persas governaram a região. A Rússia tomou posse do país no século XIX e, em 1921, a Geórgia tornou-se uma república da União Soviética. A Geórgia declarou a independência em 1991. O país logo enfrentou rebeliões em várias regiões, e os embates se prolongaram até o século XXI.
Escondida entre as montanhas do Cáucaso, a República da Geórgia possui um terreno dramático e acidentado, com desfiladeiros de montanhas com picos nevados, maravilhosas paisagens com colinas verdes que mergulham em rios tranquilos, ruínas do século VII com vestígios de ânforas, casas com varandas com videiras plantadas, como se cada pessoa fizesse seu próprio vinho de maneira artesanal.
Com uma história que se estende por 8.000 anos, investigações recentes atestam que tanto a cultura da videira como a do vinho estiveram bem estabelecidas na Geórgia no período do Neolítico. A sul de Tbilisi (capital do país), pesquisadores descobriram áreas de “vitis vinífera” domesticada, datadas por rádio-carbono a cerca de 6.000 a.C., bem como fragmentos de cerâmica do sexto milénio, com resíduo de vinho resinado.
Por isto, os arqueólogos podem não ter certeza se o local de nascimento do vinho foi no sul da Anatólia ou na Transcaucásia; o que está fora de dúvida, porém, é que a Geórgia é o único país no mundo em que os métodos de vinificação que foram desenvolvidos até 8.000 anos atrás nunca foram abandonados, e permanecem de muitas maneiras como boas práticas.
A Geórgia possui atualmente mais de 525 variedades diferentes e nativas em seu território (de um total que se pensa que já tenha sido de 1.400 ou mais!), que é um vinhedo carregado de energia, com cerca de 55.000 hectares de videiras para 500 vinícolas, chamadas localmente de maranis. Nesta região, melhor esquecer cabernet, o chardonnay, o malbec. Aqui você vai encontrar saperavi, rkatsiteli, shavkapito, kisi, tavkveri, khikhvi, ojaleshi, só para ficar nas castas mais conhecida! Mas não se espante, uma vinícola bem conhecida da Geórgia, produz um vinho tinto que mistura 417 uvas diferentes !!!
De qualquer forma, a primeira coisa que chama atenção nos vinhos é a sua identidade singular. A principal uva branca é a Rkatsiteli, que possui como característica a capacidade de alcançar altos níveis de açúcar ao mesmo tempo que retém acidez. Dizem que essa casta foi a primeira plantada por Noé depois que a inundação do dilúvio diminuiu. A principal uva tinta do país é a Saperavi, que produz vinhos de cor profunda (trata-se de uma uva tintureira, pois sua polpa também é escura), taninos potentes, alta acidez e corpo. Ambas são cultivadas há milhares de anos e são autóctones desse país.
A Saperavi cria um vinho de cor profunda, tânico, rústico, com muitos aromas de frutas negras silvestres. Possui tanino médio alto e acidez média alta. Muito estruturado. Em boca, apresentam um chocolate amargo. O final é médio alto. Poderia facilmente ser levado para um jantar ou churrasco que não perderia para o Malbec ou Tannat em termos de harmonização com as carnes.
Apesar da qualidade, os vinhos georgianos ainda são pouco conhecidos fora da região. Nos últimos anos as exportações têm crescido em ritmo intenso, e a maior parte do que exportado, no entanto, ainda tem como destino os países vizinhos, como a Rússia, a Ucrânia e os demais países da antiga URSS. A Rússia, aliás, é o destino de quase 60% das garrafas exportadas pela Geórgia e, curiosamente, cerca de metade são vinhos semi-doces. Portanto, uma dica interessante seja procurar nos rótulos os dizeres “dry red white” ou “dry white wine”.
Antigamente, de forma geral, a quantidade de vinho que se consumia por pessoa na Europa era realmente considerável. Os vinhos eram feitos com a principal finalidade do consumo para a família, e até as crianças bebiam vinho regularmente porque tinha-se a crença que o vinho era bom para a saúde! Aliás, vinho para muitas sociedades é alimento e não bebida!! E foi por isso que o vinho foi incorporado nas mesas familiares tão cedo.
Foi a principal bebida durante anos, mas com a chegada dos refrigerantes, principalmente após a Segunda Guerra Mundial que esses tempos de altos níveis de consumo do vinho acabaram, estas novas bebidas no mercado provocaram uma queda abrupta e o vinho começou a viver as consequências desta concorrência. Mas este não é o caso na Geórgia...
Poucos países produtores de vinho apresentam uma cultura do vinho tão forte quanto a Geórgia. Desde a aurora dos tempos, todos os povoados, todas as famílias, todas as casas produzem e consomem o seu próprio vinho. Uma produção artesanal, é claro, mas que mostra todas as dimensões, incluindo a dimensão espiritual (quase sagrada) do vinho entre os georgianos.
O processo de produção também pode ser diferente do que estamos acostumados a conhecer e beber. Claro que as grandes vinícolas, operam em larga escala produzem seu vinho como na maioria dos outros países, com a tecnologia envolvida de costume. Mas a diferença está no método tradicional georgiano (aquele de 8 mil anos atrás), que fermenta as uvas em grandes ânforas de barro, chamadas qvevri, que são seladas com argila e enterradas no solo por um tempo que varia de acordo com o tipo de vinho. É assim também que a população produz seus vinhos caseiros.
Aliás, a convivência do vinho com a madeira se dá com a Conquista da Gália pelos Romanos cerca de 238 a.C. Ou seja, o vinho relacionou com as barricas há mais ou menos 2250 anos. Numa história de 8.000 anos de vinho sendo feito em ânforas, a madeira está presente em menos do que 1/3 dela, mas por ser mais presente e representativa em volume, acabamos deixando o barro de lado!
Os cachos inteiros são fermentados e envelhecidos dentro dos Qvevris (ou Kvevris), que são essas ânforas de barro com volumes que podem variar de 50 até 4 mil litros. Não é necessário um controle de temperatura e o processo de clarificação ocorre naturalmente. No caso dos vinhos brancos, o processo resulta em taninos e se distinguem por seus fortes sabores, por sua cor âmbar ou laranja, estrutura tânica e aromas de camomila e feno. As vezes mostra aroma de cera de abelha e compota de frutas tropicais. O final costuma ser bem longo e surpreendente!
♦ UM CAMINHO PARA A MODERNIDADE APRENDENDO COM O PASSADO
Inovar, às vezes, significa voltar ao passado. Esta premissa explica o sucesso dos chamados vinhos laranjas e daqueles elaborados em ânforas. São vinhos que vêm despertando a atenção de quem procura diversidade em brancos e tintos e motivando, mesmo os produtores mais conservadores, a aprender com estes, digamos, vinhos alternativos.
O termo “vinho laranja” foi cunhado pelo importador inglês destes vinhos em 2004, e os georgianos preferem que os chamemos de “vinhos âmbar”! Foi na Geórgia, por exemplo, que o italiano Josko Gravner foi estudar quando decidiu mudar drasticamente a sua maneira de elaborar vinhos na região do Friuli (nordeste da Itália). Em nome de um vinho mais natural e que trouxesse a identidade do vinhedo e lugar onde foi plantado, o produtor trocou os vinhedos cultivados de Chardonnay, com idade média de 60 anos, tratados de maneira tradicional com adubação química, e a fermentação “moderna” nos tanques de inox e com precisos controles de temperatura, pela maneira antiga de elaborar vinhos em ânforas de barro.
Comprou ânforas na Geórgia, tirou os fertilizantes dos vinhedos e tratou de fermentar como antigamente, inclusive enterrando estes recipientes de barro na terra. Mesmo com a mudança drástica, as altas pontuações dos seus vinhos continuaram a mostrar o acerto de sua decisão, mudando a maneira como vinificava seus produtos.
O que define os vinhos laranjas é serem feitos de cepas brancas, mas tratados como se fossem vinificados para tintos. Dentro de um modo não-intervencionista de elaboração, a fermentação é mediada por leveduras naturais do vinhedo que são carregadas pelas uvas. É bastante normal que, além da levedura clássica da fermentação alcoólica – a Saccharomyces cerevisae –, encontremos outras populações, tais como: Candida, Brettanomyces, Metchnikovia, Kloeckera e algumas bem conhecidas por seus aromas, como Pediococcus (meia suada), Acetobacter (vinagre) e Lactobacillus (urina de rato ou Pinho Sol). O enxofre (SO2) é geralmente usado para inibir essa proliferação, com muito cuidado. Além de uva, o único ingrediente que entra na cantina da vinícola de Gravner é um pouco de enxofre.
Vinhos tinto e branco podem ser feitos nessas ânforas de barro revestida internamente com cera de abelha. Em essência, os vinhos tintos produzidos em qvevri não diferem muito dos vinhos tintos "normais", que também fermentam com suas cascas e sementes, e às vezes também com seus caules, engaços e gavinhas. Além disso, os vinhos tintos feitos em qvevri são removidos dos recipientes após a fermentação para envelhecimento em madeira ou para o retorno a um qvevri limpo. Isso também imita a prática normal de vinho tinto.
Já os vinhos brancos feitos dessa maneira são totalmente diferentes dos vinhos brancos convencionais. Passam seis meses inteiros com cascas e sementes, além de passarem todo o seu ciclo fermentativo em contato com esses materiais e com os abundantes depósitos de leveduras que o ciclo produz. A única adição externa é, na maioria dos casos, um pouco de enxofre após a fermentação. Os recipientes de barro são selados e cobertos com terra para o processo de envelhecimento.
O resultado é um vinho branco com taninos e uma profundidade de textura que nenhum vinho branco feito convencionalmente jamais terá. Os aromas e sabores dos vinhos também são singulares. Sua acidez é suave, uma vez que todos eles passaram pela fermentação malolática que suaviza o ácido, enquanto o contato com outras substâncias do líquido, especialmente os depósitos de levedura, complementa ainda mais os sabores, conferindo uma grande complexidade.
No lugar das frutas frescas que muitos vinhos brancos sugerem, estes vinhos lembram frutas secas, cogumelos, palha, nozes e uma certa dose de amargor. Muito deles são vinhos meditativos, suntuosos e sutis.
Gravner, que é uma referência mundial neste estilo de vinhos, diz que sua técnica georgiana amplifica a qualidade de suas uvas, para o bem ou para o mal. Notas oxidativas podem ser mais ou menos evidentes e provavelmente fatores fisiológicos de proteção contra a oxidação podem estar envolvidos nisso – lembrando da ação antioxidante de elementos próprios de qualquer uva, como os polifenóis nos tintos e a glutationa nos brancos. Todos são compostos químicos sintetizados pela planta e vitais para a sua defesa. A presença de acidez volátil também pode ser percebida eventualmente.
O aspecto geral tende sempre ao turvo, uma vez que a única forma de clarificação é a decantação espontânea dentro das ânforas e, ao macerar toda a estrutura dos cachos com presença de polpas, engaços e sementes, o nível de resíduos e borras é alto. Isso pode implicar em um traço gustativo frequentemente tomado por defeito: o amargor. Mas lembremos que estamos pisando em outro terreno e certos modelos de degustação clássicos deverão ser reinterpretados, pois, afinal, a eventual presença de amargor é uma consequência do método e não uma falha da vinificação.
A melhor maneira de cuidar de tudo é um nível excelente de atenção durante a vinificação e, quando se trata dos “radicais”, os georgianos possuem um grande cuidado e estão aptos a propor vinhos de qualidade gustativa capaz de atender às expectativas ocidentais, praticando prensagens suaves, que geram menos resíduos e que resultam numa melhor experiência sensorial, apesar da pouca intervenção.
O certo é que em se tratando de “vinhos âmbar”, eles são difíceis de se gostar numa primeira prova porque exigem boa carga de experiência e paciência para compreender suas infinitas nuances. Entretanto, há produtores de reconhecida competência avaliando produções no estilo georgiano.
O piemontês Angelo Gaja está deixando de fermentar os seus grandes barbarescos e barolos com as leveduras selecionadas, desenvolvidas em laboratório e vendidas, até recentemente, como sinônimo de modernidade, estas leveduras transformam o açúcar em álcool, mas também acabam por uniformizar os aromas e sabores dos vinhos, praticamente criando vinhos padronizados.
Antigamente, eram as leveduras presentes nos vinhedos e nas cascas da uva que garantiam a fermentação. As selecionadas podem ser utilizadas por vinícolas em qualquer lugar do mundo, padronizando o vinho. A volta ao passado inclui ainda a redução na utilização de barricas novas durante o amadurecimento dos vinhos ainda nas vinícolas. Se no passado recente os melhores vinhos envelheciam em barricas novas de carvalho francês, agora os enólogos diminuem a utilização do carvalho, deixando que o vinho mostre as qualidades natas.
No Chile, temos Marcelo Retamal, na vinícola De Martino criando surpreendentes “vinhos de Tinajas”! e o argentino Alejandro Vigil, um dos principais enólogos da Catena, vem abrindo mão do carvalho novo, optando pelo uso de foudres (grandes barricas de carvalho, com mais de 3 mil litros) para amadurecer seus vinhos.
Isto sem contar na Europa os “vinhos de Talha”, uma antiga tradição alentejana. Essa técnica teria sido introduzida na Península Ibérica pelos romanos, e era dessa maneira que se fazia vinho na antiguidade - após a colheita o sumo das uvas era e ainda é colocado nas enormes talhas (os volumes variam de 200 a 1500 litros) junto com parte do bagaço e deixados a fermentar – os frutos possuem uma levedura natural. O único cuidado atual e especial é em molhar as talhas na primeira semana, auge da fermentação, para diminuir um pouco a temperatura, que se elevada demais pode até rachar o barro. De resto, é esperar a natureza fazer seu papel. Após a atividade microbiótica cessar, o vinho é transferido para outras talhas, já sem o bagaço, e deixado descansar durante um período de até 12 meses. Produz-se vinho de talha tanto tinto quanto branco.
No Alentejo, o contato com o barro traz uma característica bem peculiar para o vinho - uma mineralidade e também um grande frescor, se traduzindo num vinho com características bem distintas, extremamente oxidado e sem nenhum sinal dos aromas e sabores normalmente associados à madeira. A Herdade do Rocim e Paulo Laureano entre outros fazem belos vinhos neste estilo ancestral alentejano.
♦ NEM TODOS VINHOS GEORGIANOS SÃO FEITOS NO ESTILO LARANJA
Nem todos os vinhos da Geórgia são feitos em ânforas de barro enterradas; a maioria é feita de maneira convencional, e é nesses vinhos que as variedades de uvas autóctones da Geórgia podem ser apreciadas com mais clareza.
A variedade tinta Saperavi é a mais imponente. É profundamente colorido (o nome significa "corante") e não menos prodigioso em quase todas as dimensões, com uma força energética surpreendente na boca. Um grande Saperavi é muito bom. A variedade também combina bem com pratos a base de carnes vermelhas e de caça, ou mesmo um churrasco (como as variedades Cabernet e Merlot, por exemplo). Outras variedades tintas da Geórgia incluem o Tavkveri mais leve e o Shavkapito de sabor fresco.
Por outro lado, existem pelo menos três grandes variedades brancas da Geórgia. Rkatsiteli é a mais conhecida (seu plantio fora das fronteiras da Geórgia, na Ucrânia, Moldávia e Bulgária, ajuda a torná-la a quinta variedade de uva branca mais plantada do mundo). Como Chardonnay, seu estilo varia consideravelmente de acordo com a localização e a intenção do produtor, mas fragrâncias, vinosidades, um equilíbrio nítido e um complexo repertório alusivo são possíveis.
♦ REGIÕES PRODUTORAS
A região de Kakheti, no leste da Geórgia é onde se encontra a maior parte da produção de vinho do país. Seu clima subtropical e solo rico concentram cerca de 65% a 70% dos vinhedos e as maiores e mais conhecidas vinícolas do país, inclusive com produção significativa no método tradicional.
A Cordilheira de Likhi divide a Geórgia, entre o leste e o oeste. A oeste, o Mar Negro transmite um clima mais quente e mais úmido; a leste, os ventos secos da Ásia Central contribuem para verões quentes e secos e invernos suaves. Kakheti é a região de vinho mais importante, a apenas 15 quilometros a leste de Tbilisi.
Na região de Kakheti, o Vale de Alazani (próximo à Sighnaghi) produz vinhos profundamente coloridos da variedade Saperavi. A uva (e o vinho) tem uma nota distinta, áspera, complementada por violetas, alcaçuz e frutas pretas. Muitas variedades brancas prosperam também, tais como a Rkatsiteli, Kisi e Kakhuri Mtsvane. Os vinhos Rkatsiteli, Kisi e Mtsvane, de uma única variedade, são caracterizados por vários aromas de maçã verde, citrinos, flores brancas, com uma mineralidade delicada. As vinhas velhas de Kisi têm palato de média profundidade e complexidade.
A região vinícola de Racha-Lechkhumi ainda é mais remota e obscura. Uma província pequena e montanhosa, com pequenas parcelas de vinhas emolduradas por picos dramáticos, mais conhecida pelos vinhos tintos leves e semi-doces da pequena zona de Khvanchkara – que se diz ter sido o favorito de Stalin! Ao contrário da maioria dos vinhos de estilo doce, Khvanchkara tem uma nitidez que adiciona verve aos aromas picante, aos de framboesa e de cereja preta.
Além dos arredores de Tbilisi está a província de Kartli. Aqui, a ressurreição do Mukhranbatoni do século XIX (Mukhrani), propriedade perto de Mtskheta, levou a um renascimento de vinhos de qualidade na província. As plantações primárias entre os tintos do Château Mukhrani incluem Saperavi, Shavkapito e Tavkveri; Goruli Mtsvane, Rkatsiteli e Chinuri são as principais uvas brancas autóctones. Chinuri oferece delicados aromas de hortelã, pera verde e kiwi. Tavkveri faz um rosé delicioso, terroso.
♦ A PRODUÇÃO DAS ÂNFORAS
A aldeia de Tkemlovana é considerada o templo da fabricação de qvevri. O processo de fabricação requer conhecimento ancestral, transmitido verbalmente por mestres artesãos de uma geração para a seguinte. Fazem potes de terracota com capacidade de 100 a 3500 litros, dependendo da demanda do mercado.
Este processo requer trabalho meticuloso, difícil e sazonal. Os qvevri são moldados à mão, em camadas sucessivas, que são então cozidas apenas em agosto (o período mais quente do ano - para secar adequadamente), em fornos gigantes fechados por uma parede de tijolos.
Finalmente, o interior do qvevri é revestido com uma camada de cera de abelha, garantindo sua firmeza e propriedades antissépticas.
♦ TEMPERATURA IDEAL DE SERVIÇO
De forma geral estamos acostumados entre 16 a 18ºC para os tintos, 8 a 10ºC para os brancos, entre 6 a 8ºC para os espumantes, com algumas variações obviamente. Tintos mais leves tendem a ser melhor provados mais resfriados que os mais pesados, assim como brancos mais encorpados também costumam ser servidos com temperatura um pouco mais alta que os mais leves e ligeiros.
Vinhos laranjas pelo seu processo de produção após longas macerações com suas cascas, o que os torna levemente âmbar, e, também, com características bastante diferentes dos vinhos brancos convencionais. Há laranjas mais leves, com macerações mais curtas, que podem ir muito bem com temperatura de serviço entre 8 a 12ºC. Já para os mais estruturados, com macerações bastante longas, sugere-se que sejam servidos entre 12 e 14ºC, para que mostrem melhor suas qualidades aromáticas e gustativas.
Alguns sommeliers recomendam também que o serviço seja feito em decanters, para que se abram e mostrem todo o seu potencial.
Há, porém, quem defenda que eles devem ser tratados simplesmente como tintos e servidos em temperatura similar (pouco abaixo dos 20ºC).
♦ HARMONIZAÇÕES PARA VINHOS LARANJAS
A comida típica é realmente um dos maiores atrativos da Geórgia. Quem pesquisar, vai encontrar muitos elogios para a culinária local.
Comida local também é um elemento social importantíssimo. Sabor e simplicidade, o georgiano cozinha com ingredientes locais e da época. Não espere encontrar, em uma refeição típica, ingredientes exóticos, pratos super refinados, nem nada muito light. A mesa local tem vegetais, carnes, muito pão e muito, muito queijo.
Dentre tantas coisas gostosas da cozinha da Geórgia, não podem faltar em uma refeição típica:
– Khachapuri: Talvez o mais famoso dos pratos típicos, kachapuri significa, literalmente, pão com queijo. Mas não, não é um sanduíche. É uma massa, assada (com consistência de pão mais macio) e recheada com grandes quantidades de queijo. São vários tipos, cada região tem o seu e dá para encontrar em qualquer lugar, de restaurantes às portinhas que vendem os salgados típicos pela cidade. O mais popular com os estrangeiros é o acharuli, típico da região da Adjara, na costa do Mar Negro. Tem um formato ovalado, de “canoa”, cheio de queijo derretido dentro, com o bônus de um (ou dois, ou mais) ovo e um pedaço generoso de manteiga, colocados por cima do queijo assim que o prato sai do forno. A ideia é misturar tudo, de preferência usando um pedaço da ponta da massa, e comer ainda quente, com aquela montanha de queijo derretido escorrendo por todos os lados.
– Khinkalis: São trouxinhas ou bolinhos de massa enrolados com um recheio ou de massa sem recheio. A massa pode ser baseada em pão, farinha ou batatas e pode ser recheada com carne, peixe, queijo, legumes, frutas ou doces), maiores que os asiáticos, cozidos e recheados tradicionalmente de carne. Há outras variações de recheio, algumas menos tracionais, mas igualmente deliciosas, como queijo, cogumelos e batatas.
Come-se com as mãos mesmo e nas primeiras vezes é inevitável fazer sujeira, pois o recheio não é seco e quando você morde espirra caldo para todo lado. É um prato que às vezes divide opiniões entre os estrangeiros, pois há quem não aprecie a textura da massa, que é cozida e, por isso, meio molenga. Perfeita para dias mais frios e para quando se exagerou no vinho no dia anterior.
– Bradrijani Ngvizit: Este nunca pode faltar na sua prova de culinária georgiana! É muito simples, são fatias de berinjela levemente fritas e recheadas com uma pasta feita com nozes, alho e temperos locais e decorada com sementes de romã. Os sabores todos combinam muito bem e é muito fácil gostar desse prato.
– Shkmeruli: Gosta de frango? Gosta de alho? Se a resposta for sim, este é o seu prato. O frango cozido em molho de alho é típico da região de Racha e também não é dos mais difíceis de reproduzir em casa. O frango inteiro cortado em pedaços, é cozido em um molho feito simplesmente de alho e leite, finalizado no forno. Há quem acha que fica mais saboroso se feito com creme em lugar do leite, que deixa o molho mais denso. Se tiver um pouco de adjika (pasta de pimenta típica) para ficar picante, melhor ainda.
– Salada Georgiana: Tomates, pepinos e cebolas, cortados em pedaços e misturados a um molho de nozes. É muito simples, não tem nada de especial a não ser o sabor dos vegetais. Os tomates da Geórgia são deliciosos e muito suculentos e mesmo os pepinos, têm um sabor diferente dos que comemos no Brasil. As nozes complementam o sabor e o conjunto todo faz uma boa entrada, mas também um bom par para carnes.
♦ MAS E SE NÃO FOR COMIDA TÍPICA?
Diante do crescente interesse pelos vinhos laranjas, começam a aparecer questões sobre as harmonizações. A Revista Adega, e um de seus artigos sobre estes vinhos sugeriu:
- Massas com trufas - Um dos sabores que os vinhos laranjas costumam a ressaltar são os amargores (como do umami). Para quem quer uma opção bastante direta, pode escolher um talharim simples, na manteiga, ou com algum creme leve finalizado com trufas.
- Atum selado com vegetais grelhados - O corpo dos laranjas consegue suportar até carnes vermelhas (geralmente mais leves), mas uma combinação interessante é com atum, que, apesar de ser peixe, tem textura mais intensa. Uma posta grelhada com gergelim acompanhada de salada ou de vegetais grelhados é boa opção.
- Cordeiro temperado - Entre as possibilidades de harmonização com carnes para os laranjas está o cordeiro. A estrutura do vinho é capaz de suportar e combinar com a carne e as especiarias com as quais ela tende a ser temperada. O famoso cordeiro marroquino ou o carneiro recheado, pratos típicos da culinária árabe, harmonizam bem com os laranjas.
- Paella – por terem tantos e tão intensos os sabores, uma paella que incorpora diversos frutos do mar, pode casar bem com um bom vinho laranja, por sua estrutura.
♦ ONDE ENCONTRAR VINHOS NO ESTILO LARANJAS EM BELO HORIZONTE:
Um e-commerce nacional de bebidas está importando alguns rótulos de duas vinícolas da Georgia. Em Belo Horizonte, a Loja Hipper Frios está vendendo os rótulos georgianos. (Loja Lourdes: 3213-4082 – Fale com Felipe Zanforlin / Loja Feira dos Produtores: 3484-5357).
Entretanto, vale a pena ressaltar que a primeira grande difusão dos Vinhos Laranjas em Belo Horizonte foi fruto do trabalho de Guilherme Correa quando era sommelier da Decanter. Lembro com clareza e saudades de suas degustações quando nos apresentou os vinhos de Josko Gravner (Friuli/Itália) e Simcic Marjan (Eslovênia), que apesar de não serem georgianos representam muito bem o estilo. Valendo também provar os vinhos da De Martino de Marcelo Retamal, no mesmo estilo, feitos em Tinajas. Hoje, os vinhos da Decanter podem ser encontrados na Adega Royal, no Mercado do Cruzeiro (31-3281-3539).
Para amantes dos vinhos de Portugal, a dica são os vinhos Cartuxa Talha e Cortes de Cima Amphora (ambos tintos) aqui vendidos pelo Antonio Salles (31-99615-2860) e o ArtTerra Amphora do produtor Alexandre Relvas importado pela Cantu, aqui em BH representada pela Ana Paula Diniz (31-99724-3332).
No Brasil são encontrados outros vinhos portugueses neste estilo, como o Herdade do Rocim Amphora Branco (importado pela World Wine), o Bojador Vinho de Talha Tinto (importado pela Wine Lovers), José de Sousa Tinto (com parte fermentada em ânforas de barro e estágio de nove meses em barricas de carvalho francês e americano), o Piteira Tinto de Talha (com todo o processo de vinificação executado em talhas de barro, criando um vinho cheio de grande vivacidade e frescor, com uma rusticidade gostosa) e o Sidecar Tinto 2015 de Susana Esteban, criado junto com o casal Filipa Pato e William Wouters.
Em resumo, não falta vinho para quem quer provar os vinhos da Geórgia ou os do estilo Laranja!!! Amplie os seus horizontes de vinhos!!! Saúde !!!
(Baseado em informações sobre Vinhos da Geórgia e Vinhos Laranjas encontradas na internet).