Alguns dos melhores vinhos do mundo são obtidos a partir da Assemblage, palavra de origem francesa, que nada mais é do que a mistura de dois ou mais vinhos elaborados com diferentes variedades de uvas. Este tipo de vinho também pode ser chamado de blend (em inglês), de taglio (na Itália), de vinho de lotes (em Portugal) ou de corte, como falamos no Brasil.
Na França e em Portugal, principalmente, os assemblages são muito comuns. E geralmente os nomes das uvas nem constam nos rótulos, e sim o da região de origem do vinho, porque o consumidor já sabe quais são as variedades características de cada denominação. Por exemplo, o corte bordalês geralmente é um vinho feito a partir da mistura de vinho da uva Cabernet Sauvignon, com Merlot, acrescido às vezes de Cabernet Franc, Petit Verdot e Côt (a nossa Malbec).
Ao longo dos últimos séculos, aprendemos que diferentes variedades de uva são geralmente melhor vinificadas (ou seja, transformadas em vinho) separadamente e depois misturadas. Antigamente, as uvas para vinho eram colhidas e vinificadas juntas - chamamos isso de "mistura de campo". (Na atualidade, o vinho do Porto é um dos poucos vinhos que ainda se pode encontrar feito desta forma!)
Depois que o vinho for armazenado com segurança em barricas (ou tanques), é hora de criar a mistura. Neste ponto, sendo difícil usar seu olfato por causa dos aromas intensos de leveduras, os produtores de vinho tendem a confiar no sabor e na textura para criar uma mistura de vinhos.
Quando você olha para os blends de vinho no mercado hoje, você percebe algumas misturas comuns: Cabernet é comumente misturado com Merlot. Se a uva for Syrah a mistura será com Grenache e Mourvèdre.
O que é interessante é que você raramente, ou nunca, encontra Cabernet com Pinot Noir. Por que é isso?
♦ Tradição: regiões vinícolas históricas desenvolveram combinações de vinhos por um longo período de tempo. As misturas francesas clássicas são as referências de hoje.
♦ Região e Clima: O que cresce junto, vai bem quando se mistura junto. Variedades de uva de uma mesma região e que se adaptam ao mesmo clima geralmente são bons parceiros de mistura. (Talvez por isso, por serem de diferentes regiões e climas, que Cabernet e Pinot não costumam ser misturados).
As assemblages tintas são uma das categorias mais conhecidas e bebidas mundo afora, mas você já se perguntou exatamente como os produtores de vinhos fazem essas misturas? Vamos então procurar dar uma visão sobre como eles trabalham criando os vinhos de corte.
E chegamos à questão filosófica: misturar vinhos é arte, ciência ou um pouco de ambos?
Antes de mais nada, para um enólogo ser bom em misturar vinhos, ele precisa conhecer sua ciência, conhecer as parcelas do vinhedo, as uvas plantadas, a maturação obtida na safra. Mas para ser ótimo, ele precisa trazer algo de arte e até mesmo certa magia para a tarefa.
Vamos começar pela ciência - a química do vinho. Grande parte da qualidade de um vinho é resultado da condução do vinhedo (procurando baixos rendimentos por exemplo), da colheita (se feita manual ou mecânica, e a que horas da madrugada ela foi feita, por exemplo), da vinificação (com leveduras naturais ou selecionadas por exemplo), da maturação (se passa por madeira ou não) e, em seguida, do envelhecimento de vinhos que são tecnicamente estáveis. Os taninos, ácidos, pH e álcoois são estabelecidos no início da vida do vinho, então é chegada a hora de corrigir algo se o enólogo quiser evitar falhas científicas, ao invés corrigi-las mais tarde.
Sob o ponto de vista técnico, a ciência só pode levá-lo até esta fase. Se o enólogo busca criar um vinho excelente - uma mistura que resistirá ao teste do tempo e virar um ícone - ele precisará aprofundar-se na arte e na magia da alquimia do vinho. Vai ter que desafiar-se como enólogo, provar vários vinhos criando pontos de referências para produzir algo que seja verdadeiramente o seu vinho, com estilo e personalidade próprios.
Durante o processo da assemblage não se observa números ou indicadores analíticos. O enólogo cria uma visão para a mistura que pretende fazer e guia-se pelas sensações. Degusta os lotes individuais, alguns são selecionados e outros são deixados de lado. Uma vez criada a sua base, começa então a focar em qualquer ponto fraco do aroma ou do paladar de modo que a mistura final seja verdadeiramente completa e perfeita. É um processo lento, criterioso, e é mais arte do que ciência nesta hora.
Historicamente, sabe-se que certas variedades de uva possuem sinergias, como as variedades de Bordeaux e do Vale do Rhône. Essas sinergias geralmente se traduzem no Novo Mundo também, e é por isso que você encontrará muitas combinações incríveis de "estilo Bordeaux" ou "estilo Rhône" criadas no Chile, ou na Austrália, ou na Califórnia, entre outros países ou regiões produtoras do mundo do vinho.
MISTURAS CLÁSSICAS:
● Bordeaux – França: Uma das regiões vinícolas mais famosas e respeitadas para a mistura é Bordeaux, na França. Esta região é conhecida por sua assemblage de Cabernet Sauvignon com Merlot, e as vezes Cabernet Franc e Petit Verdot. O estilo de mistura Bordeaux usa os sabores únicos que cada variedade de uva traz de melhor. Então o Cabernet Sauvignon traz a estrutura forte de seus taninos, enquanto Merlot aporta sabores de frutas escuras ricas e mais suaves taninos para envolver o blend. O melhor dos dois mundos quando se trata de misturas de vinhos. As cinco variedades de uvas mais populares utilizadas nestas misturas são Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Malbec e Petit Verdot.
O Cabernet Sauvignon é um vinho encorpado com um carácter picante e uma grande textura de taninos. Termina com uma nota de carvalho, tornando-se um vinho grande e longo. Merlot e Cabernet Sauvignon são semelhantes em muitos aspectos, mas os sabores ligeiramente mais para a cereja de Merlot e mais refinado, em forma de amaciar os taninos e compensar o caráter picante das variedades Cabernet.
Os vinhos Bordeaux da “margem direita” têm predominância de Merlot e Cabernet Franc. Cabernet Franc tem um sabor apimentado que pode ser misturado com Merlot para adicionar complexidade e um acabamento dinâmico. Malbec é uma grande variedade para os amantes de sabores de frutas pretas com um final suave e delicioso. Petit Verdot é frequentemente usado em misturas para criar notas florais, tanino e adicionar cor. É mais comum em regiões com climas quentes, como Espanha, Argentina e Austrália.
● Rhône – França: Grenache, Syrah e Mourvèdre são as principais uvas do blend da região do Rhone. Entretanto, no Rhône Sul, os blends podem incluir até 19 uvas diferentes, incluindo uvas brancas.
Grenache é um vinho leve, frutado e com final de leve tanicidade. É perfeito para quem quer um vinho mais frutado sem todo o peso. Syrah traz sabores ousados de frutas pretas e pimenta do reino preta na mistura, bem como cores profundas. O acabamento mais suave ajuda a se livrar de um pouco da tanicidade da Grenache. Mourvèdre é um vinho robusto com sabores ricos de frutas pretas e um sabor apimentado. É perfeito para pratos de carne ou tábuas de queijos. O vinho blend – chamado de GSM, é feito em diferentes países (como Austrália, Chile e África do Sul, para um sabor único.
● Champagne – França: outro exemplo clássico de blend de uvas. Apesar da região de Bordeaux ser mundialmente conhecida pelos seus blends, Champagne talvez seja onde essa arte de criar mesclas atinja seu ponto culminante. Aqui há apenas três uvas (na verdade há outras quatro variedades autorizadas, mas sua produção é muito pequena): Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier. E com somente essas três castas, os produtores criam uma infinidade de misturas e sabores.
Em Champagne o que conta não é apenas a proporção de cada uma das castas, definida obviamente pelo estilo de cada casa, mas também a mescla dos famosos vinhos de reserva, porções que são separadas de todas as safras para se misturarem com safras futuras e fazer com que os sabores do Champagne se mantenham quase que inalterados, ano após ano. Um chef de cave precisa ser capaz de mesclar uma quantidade significativa tanto de vinhos da safra corrente como de vinhos de safras antigas para criar uma única cuvée. Para isso, são necessários anos de experiência. Além disso, é preciso entender como cada uma das variedades, vindas de diversos terroirs, contribuem com o sabor.
● Itália – Uma região vinícola clássica de mistura de vinhos é a Itália. Este país é o lar de vários cortes famosos. Um dos blends de vinhos italianos mais famosos é o Chianti Classico. Este vinho é uma mistura de uvas Sangiovese e atualmente com o Cabernet Sauvignon. Com o aporte do Cabernet Sauvignon, os enólogos podem criar um vinho complexo com notas de frutas escuras, ervas e especiarias.
● Vinhos da Toscana: Os vinhos da Super Toscanos são elaborados com uma mistura de Sangiovese, Merlot, Cabernet Sauvignon e/ou Cabernet Franc. Estes vinhos são conhecidos por seus intensos sabores de frutas e gracioso potencial de envelhecimento.
● Espanha - Os vinhos espanhóis são vinhos típicos de misturas de diferentes castas. Isso ocorre porque o clima e o solo na Espanha variam tanto de região para região que muitas vezes é necessário um blend de variedades de uvas para criar um vinho com o perfil de sabor desejado. Em algumas regiões, como Rioja, quase todos os vinhos são vinhos de blend de Tempranillo e Garnacha. No entanto, existem também algumas regiões, como Priorat, onde os vinhos monovarietais são mais comuns. Independentemente da região, a maioria dos vinhos espanhóis são blends de diferentes castas. Isso dá aos amantes de vinho na Espanha uma grande variedade de perfis de sabor para escolher, tornando os vinhos espanhóis alguns dos mais interessantes e complexos do mundo.
● Portugal - A maior parte da produção vitivinícola em Portugal é dedicada aos vinhos de assemblage (de lote). De fato, muitos dos melhores vinhos do país são o resultado de uma cuidadosa mistura de diferentes castas. Isso permite que os enólogos criem um vinho único representante do terroir de seus vinhedos, atendendo às preferências dos clientes.
Muitos vinhos portugueses são elaborados com um blend de castas Touriga Nacional, Tinta Roriz e Touriga Franca, produzindo um vinho rico e encorpado com notas picantes.
No entanto, existem muitas outras variedades de uvas que podem ser usadas em lotes, resultando em uma grande variedade de estilos. As técnicas de mistura variam de produtor para produtor, mas geralmente envolvem fermentar diferentes sucos de uva (mostos) separadamente e depois misturá-los antes do engarrafamento.
Isso permite que o enólogo controle cuidadosamente o caráter do vinho. Embora muitos vinhos portugueses sejam exportados, também existem excelentes blends locais que valem a pena experimentar.
● Croácia - Como na Espanha, a mistura de vinhos é muito comum na Croácia. Isso ocorre porque o clima e o solo na Croácia diferem tanto de região para região que muitas vezes é necessário um blend de variedades de uvas para criar um vinho com o perfil de sabor desejado. Em algumas regiões, como Ístria, muitos vinhos são misturas. No entanto, existem também algumas regiões, como Dalmácia, onde os vinhos de uma variedade única são mais comuns. Na tradição do vinho Eslavônia, datada do século VIII, a região agora abriga mais de 8 vinícolas, e o Plavac Mali - uva nativa da Dalmácia e Ístria é cultivado, gerando vinhos conhecidos pelo seu sabor intenso e alto teor alcoólico.
● Vinhos Gregos Blends: O grego Rapsani Blend é feito com uvas que crescem nas altas encostas abaixo do Monte Olimpo, incluindo Xinomavro, Krasoto e Stravroto. Estas uvas oferecem sabores de framboesa e tomate seco ao sol com um alto tanino e acidez. O blend traz frutas mais redondas, macias, volumosas e um final suave. Alguns acreditam que Stravroto adiciona cor ao vinho.
Em resumo, a produção de um excelente vinho começa pela ciência e termina com a arte! Saúde !!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (Este artigo está baseado em material disponível na internet, e minhas considerações durante a prova dos vinhos e pesquisas).
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